Quando a noite cai
E erguem-se os medos
De dentro do peito
Trago o abismo.
Mas, não rói receio
Que no fundo só da vida
toco poesias de margem.
Quando a noite cai
E erguem-se os medos
De dentro do peito
Trago o abismo.
Mas, não rói receio
Que no fundo só da vida
toco poesias de margem.
Por vezes me passa
Observando os muros que cercam a terra
Que os limites que me formam
Deformam os meus jardins.
Quando planto afetos em mim
Buscando desabrochar
Frutos que me transformem
Sangro farpados arames
Vontade perversa de aprisionar o mundo.
Meu jardim é dos bichos, dos vermes
Dos que fermentam interiores
Adubo eterno da morte
Semeio multidões que me conduzam
Para além da sólida contração
Da vertigem de existir.
Quando a busca urge
O deslocamento age
Abertura de limites sólidos
Dissolvo imensidão de mar.
Quando a busca grita
Arranhando a carne
Pranto de garganta aflita
Meu corpo lacera um constante devorar.
Quando a busca volta, refletida
O que em mim, afinal, busca?
E se deixo de ser quem busca
quando encontro-me aqui
No úmido do peito
É que a busca não tem fim.
Me custa crer que a mão
Operária do mundo
Organizadora da prática
Seja artífice da morte
E da paixão.
Esta mão que na sua presença
Treme, esquenta e sua
Mão de gozos e de carícias
É aquela que me vela os olhos
Quando choro ferido de vida.
De toda contradição da mão
Veículo do caos e do cosmos
Me invade a nítida potência
Ponte entre mim e tudo
De estendê-la por tanta carne-viva
E receber o toque que germina
Com sua mão sobre a minha.
O vazio da casa
Na janela
Na cama
Abriga o toque bravio do silêncio
Pele porosa transpassada de vida
O vazio que me habita
No peito
Na testa
Na carne
Abre o corpo pro que está por vir
Futuro que brota no meio do mundo
Este vazio que me invade
Não alimenta medos na noite
Não corrói as estradas do dia
Não diz da violência que arruína
Quando me vejo diminuído
Preso em recipientes de vidro
Organizados nas imóveis estantes
De vitrines sociais.